Quem vê Ricardo Gomes dirigindo o próprio carro, retomando hábitos antigos como beber um vinho e viajar, não imagina que as chances eram pequenas quando ele deu entrada na emergência do Hospital Pasteur, Zona Norte do Rio de Janeiro, naquele 28 de agosto de 2011. Minutos antes, ele sofrera um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVC) na beira do campo do Engenhão durante o segundo tempo do clássico entre Vasco e Flamengo, válido pelo primeiro turno do Campeonato Brasileiro. Começava ali uma bem-sucedida batalha pela vida que completa um ano nesta terça-feira. Com uma recuperação impressionante, Ricardo deseja completar o ciclo em 2013, quando pretende voltar a trabalhar como treinador.
- Está tudo indo maravilhosamente bem. A recuperação foi fantástica e falta apenas uma coisinha aqui e ali. É uma luta diária, um recomeço... Para este ano não dá, mas no próximo eu volto a trabalhar à beira do campo - disse Ricardo Gomes ao GLOBOESPORTE.COM antes de mais uma sessão de fisioterapia em uma clínica na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Para muitos, ainda soa impensável imaginar Ricardo Gomes novamente à beira do gramado comandando um time de futebol. Mas, um ano depois do AVC, convém não duvidar da força de vontade do treinador, que segue à risca a dura rotina de recuperação. São sessões de fisioterapia, musculação e fonoaudiologia, além de check-ups frequentes que animam os profissionais envolvidos no tratamento.
Em sua recuperação, o técnico enfrenta pequenas dificuldades, responsáveis por adiar a volta ao trabalho. Algumas palavras ainda escapam, especialmente em situações de ansiedade e estresse. No dia a dia, no ambiente familiar, são raros esses momentos. Ricardo Gomes ainda manca um pouco na perna direita, lado afetado pelo AVC. Os movimentos na mão também apresentam pequena restrição. Porém, o esforço é diário e constante, resultado da dedicação que marca a vida profissional desde os tempos em que ele era zagueiro, deixando Ricardo com a certeza de que em breve poderá retornar à beira do gramado.
Equipe médica ainda se emociona
A recuperação de Ricardo Gomes surpreendeu até os familiares e médicos que demonstravam mais otimismo naqueles primeiros dias de internação. Mesmo um ano depois, a força do técnico ainda emociona a equipe médica. Fabio Miranda, clínico particular do treinador, relembrou os 21 dias em que ele esteve internado no Hospital Pasteur. O rápido deslocamento do Engenhão até o local da cirurgia, além da preparação imediata da equipe de emergência para iniciar os procedimentos, foram determinantes para superar o momento mais dramático, horas depois do AVC.
- Foi uma conjunção de fatores. Melhor do que está hoje é praticamente impossível. Ainda existe uma sequela mínima na fala e no andar, mas ele não precisa de bengala, já dirige e se comunica perfeitamente. Do ponto de vista médico, ele pode voltar a fazer o que quiser, mas essas pequenas alterações o fazem se preservar mais um pouquinho e seguir no trabalho com o objetivo de zerar. Ele é muito determinado - explicou.
Fábio Miranda ainda prevê melhoras na fala do treinador. Já Elizabeth Gonçalves, fonoaudióloga que acompanha Ricardo desde as primeiras sessões, considera o treinador praticamente perfeito. Segundo Elizabeth, qualquer pessoa pode aparentar nervosismo e esquecer uma ou outra palavra em situações de estresse.
- Para mim, a recuperação dele é total. A fala está muito próxima do normal, o que o qualifica para qualquer coisa. Quanto ao esquecimento, a fala sofre influência do meio, ou seja, se estamos em situação de estresse, qualquer pessoa falante normal modifica sua desenvoltura, ocorrendo lacunas maiores, preenchidas, por exemplo, com palavras curtas, como "tá", "hum", entre outras - esclareceu a fonoaudióloga, que atualmente realiza uma sessão por semana com Ricardo Gomes.
As sessões de fisioterapia continuam intensas, mas com menor regularidade do que há alguns meses. Natália Runco, filha do médico do Flamengo e da Seleção, José Luiz Runco - que foi um dos principais responsáveis pela agilidade no atendimento, já que é um dos sócios do Pasteur e percebeu a gravidade ainda em campo -, comanda o tratamento ao lado do marido, Luiz Tiago Santos de Carvalho. Atualmente, são três sessões em média por semana, além de alguns exercícios complementares feitos nos demais dias. A equipe comemora cada evolução como uma vitória dos times comandados por Ricardo. Nas últimas semanas, ele melhorou bastante nos movimentos do braço direito.
- São diversos movimentos que foram aprimorados ao longo desse ano. Tudo aquilo que fazemos é em função da necessidade do Ricardo. Em certos momentos, ele precisa de mais intensidade na mão, em outros na perna... Mas, se lembrarmos um ano e olharmos hoje, fica clara a vitória. A gente não tinha nenhuma certeza de nada lá no início, quando os exercícios de fisioterapia eram feitos com ele ainda internado. É um sentimento muito gratificante para nós vermos a evolução - disse.
Médicos e fisioterapeutas que acompanham Ricardo Gomes são unânimes ao destacar que consideram o técnico um vencedor por superar o AVC com tanta força de vontade. Mas, obstinado, ele só descansará quando fechar o ciclo e conquistar a vitória final, voltando ao lugar em que todo o duro processo começou, naquele 28 de agosto de 2011: o banco de reservas.
Os momentos marcantes da luta de Ricardo Gomes
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