Raja Casablanca abriu o placar do jogo
No dia mais importante de sua história, o Atlético Mineiro sofreu como nunca em seus 104 anos. E chorou como nunca quando mais deveria sorrir.
No Mundial que poderia coroar sua reconstrução, o time de Cuca, de Victor, de Ronaldinho, Tardelli, Réver e Jô caiu. Desabou diante de um rival inferior, o Raja Casablanca, que fez o jogo de sua vida e venceu por 3 a 1.
A decepção de cada um dos mais de 10 mil atleticanos em Marrakech estava em olhares incrédulos, perdidos no horizonte. Em lágrimas de quem cruzou o Atlântico para viver um sonho, mas que talvez quisesse acordar de novo nesta quarta-feira para reviver a história, em busca de um final diferente.
Não houve Ronaldinho que resolvesse, mesmo com um belo gol de falta. Não houve Victor que impedisse o desastre, mesmo com uma defesa incrível.
Houve um time nervoso, que esbarrou em erros primários e num erro capital do árbitro espanhol Carlos Velasco Carballo, que marcou um pênalti duvidoso, decisivo para a partida.
O Atlético começou o duelo em Marrakech com o que tinha de melhor. Victor, um dos heróis da Libertadores, via à sua frente a mesma dupla de zaga daquela conquista - Réver e Leonardo Silva - além de Marcos Rocha, na lateral direita. Na esquerda, Lucas Cândido, garoto que começou o ano como volante e assistindo ao time principal pela TV; terminou como titular da lateral esquerda.
No meio-campo, a dupla de volantes formada por Pierre e Josué. À frente, o quarteto ofensivo que fez do time um dos ataques mais temidos do Brasil. Diego Tardelli, Fernandinho, Jô e Ronaldinho.
O Ronaldinho do Atlético, como ele mesmo se definiu diante das provocações de um adversário que disse não vê-lo mais como o jogador do Barcelona. O Ronaldinho Mineiro, que disse não querer ser protagonista, mas apenas fazer parte de um time vencedor.
Mas o Atlético começou a partida tenso. Era como se os onze jogadores sentissem sobre suas costas o peso de uma responsabilidade que só o Atlético tinha: a de vencer a partida.
O Raja Casablanca, time de uma torcida apaixonada que fez do jogo uma festa digna de um campeonato mundial, era um franco-atirador. Um time que vencera de forma improvável o Monterrey nas quartas de final. Uma equipe que fazia, também, o maior jogo de sua história. Sua final de Copa do Mundo.
Os primeiros minutos foram de poucas chances e muita disputa. Em campo, o Raja tentava surpreender com ataques pelas laterais, e o Atlético tentava levar perigo nas bolas paradas. Nas arquibancadas, mais de 10 mil vozes empurravam o Atlético; o dobro de gente cantava pelo Raja. Eram 35219 pessoas no Grand Stade de Marrakech, em uma quarta-feira que o tornava ainda mais enorme e vibrante.
Uma gritaria que virou silêncio - das duas partes - aos 21 minutos do primeiro tempo. Depois de jogada de Fernandinho, Lucas Cândido avançou pela esquerda e cruzou para o meio da área; Jô chegou de carrinho e tocou na bola, que saiu à esquerda do gol de Askri. O Estádio de Marrakech prendeu a respiração.
A grande chance da partida até ali fez bem ao Atlético. Com mais paciência para tocar a bola no ataque e marcando pressão na saída de bola do adversário, o clube mineiro ainda criou outra grande chance aos 32 minutos: Fernandinho, livre na área após cruzamento de Marcos Rocha, chutou para fora.
Foram 15 minutos de lucidez, e que o gol atleticano parecia uma questão de tempo. Não era.
O Raja cresceu e quase marcou duas vezes, ambas com o capitão, Moutaouali. Na primeira, aos 36 minutos, Victor fez uma defesa que justificou a idolatria de cada um dos atleticanos no estádio. Aos 40, o camisa 5 mais uma vez teve a chance, mas chutou para fora.
Com as duas equipes acordadas, os cinco minutos finais tiveram chances de parte a parte. O Atlético, novamente em jogada de Jô e Marcos Rocha, quase marcou aos 43 - o atacante passou da linha da bola. O Raja respondeu com Iajour, que ficou frente a frente com Victor, mas chutou para fora.
O primeiro tempo acabou em um misto de alívio e sofrimento para a torcida atleticana. O sonho do Mundial, tão vivido durante o dia de festa em Marrakech, ficou em suspensão durante 45 minutos. Foi tenso, foi cruel, foi de roer as unhas.
Mas seria ainda mais tenso. Mais cruel. Mais terrível. De roer a alma.
Foi aos 8 minutos da segunda etapa. Depois de um contra-ataque pela esquerda, Iajour recebeu passe na intermediária, avançou e chutou na saída de Victor. O Raja fazia 1 a 0.
Poderia ter feito mais. O Atlético apagou. E nem os gritos de "Eu acredito" vindos da arquibancada pareciam acordar os jogadores. Por três minutos, nada se via em campo. O segundo gol do Raja só não saiu porque Chtibi estava impedido quando tocou a bola para as redes.
Moutaouali, capitão do time marroquino, fazia graça. Deu toque de letra, olhou para uma lado e tocou para outro. Era um Ronaldinho improvisado em uma noite em que o original pouco aparecia.
Aos 11 minutos, o treinador Faouzi Benzarti colocou em campo o zagueiro Mabide - aquele que, no domingo, disse que Ronaldinho não jogava mais como antigamente, que era "apenas um nome".
O Atlético parecia perdido. E as palavras do lateral direito Marcos Rocha, irritado ao ser substituído por Luan, mostravam um time que parecia à beira do abismo. "Burro pra caral***", gritou, enquanto deixava o campo.
O palco estava armado para um desfecho de pesadelo.
Era a hora de Ronaldinho, o mineiro, ser protagonista. Foi aos 18 minutos que o camisa 10 finalmente entrou no jogo. Em uma cobrança de falta perfeita, ele colocou a bola no ângulo, empatando o duelo e devolvendo esperança ao torcedor atleticano.
Valia a pena acreditar, e o chapéu em Erraki, no meio-campo, mostrava que Ronaldinho, o do Atlético mesmo, talvez já fosse o bastante para colocar o clube mineiro na final.
Até o telão do estádio, apagado desde o início da segunda etapa, voltou a funcionar. Ronaldinho voltou a funcionar. O Atlético voltou a funcionar. E a torcida do Raja, pela primeira vez, ficou minutos inteiros sem cantar, sem pular, sem transformar o estádio de Marrakech em sua casa.
Aos 30 minutos, Ronaldinho olhou para Réver, o capitão do Atlético, que passou por toda a reconstrução do clube nos últimos dois anos, e disse: "Faltam 15". E, em um quarto de hora, o clube poderia definir seu destino.
Não decidiu.
Para piorar, entrou em ação um personagem até então discreto na partida entrou em ação: o árbitro espanhol Carlos Velasco Carballo, que viu pênalti de Réver em Iajour aos 38 minutos. Na cobrança, Moutaouali chutou em um canto; Victor, canonizado pela torcida na Libertadores por uma defesa em um pênalti, não pôde fazer milagre.
O milagre do dia era outro. Feito pelo Raja Casablanca, o segundo africano a chegar à decisão do Mundial de Clubes, repetindo o Mazembe, de 2010.
Madibe, aquele mesmo que falou que Ronaldinho não era mais o mesmo da época do Barcelona, fez o terceiro no fim - quando o Atlético, desesperado pelo empate, estava todo no ataque.
Na decisão, marcada para sábado, também em Marrakech, o clube marroquino enfrentará o Bayern de Munique, que bateu o Guangzhou por 3 a 0.
O Atlético, possivelmente no jogo mais triste de sua história, enfrentará o clube chinês na luta por um terceiro lugar com pouco ou nenhum significado.
FONTE: ESPN
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