domingo, 16 de setembro de 2012

Da queda ao retorno, tênis brasileiro viveu boicote, humilhação e agonia na Davis; relembre




O tênis brasileiro chegou neste sábado, em São José do Rio Preto, a um patamar que não alcançava desde 2003. Com a vitória de Marcelo Melo e Bruno Soares sobre Alex Bolgomolov Jr. e Teymuraz Gabashvilli, a equipe fez 3 a 0 na Rússia, voltando ao grupo mundial da Copa Davis.

A agonia na tentativa brasileira de retornar à elite teve quase uma década. No período, houve derrotas de todos os tipos: as improváveis, as inapeláveis, as humilhantes. O tênis nacional caiu para o terceiro nível da Davis – o Zonal Americano 2 –, viveu um drama com a ausência de alguns de seus principais jogadores, passou por trocas de capitães.

Para entender o tamanho do drama que terminou neste sábado, em São José do Rio Preto, é preciso revisitar a história. Uma história que começa em Helsingborg, na Suécia, no dia 9 de fevereiro de 2003. Naquele domingo, a equipe brasileira entrou em quadra com vantagem de 2 jogos a 1 contra os anfitriões. 

Bastava uma vitória de Gustavo Kuerten contra Jonas Bjorkman para os brasileiros garantirem a permanência no Grupo Mundial. Mas Guga perdeu e, na sequência, Flavio Saretta levou 3 a 0 de Andreas Vinciguerra.

O Brasil teria de disputar a repescagem, como já fizera em 2002. E o rival seria o Canadá, o mesmo adversário do ano anterior. Os brasileiros perderam no carpete de Calgary, caindo para o Zonal Sul-Americano. 
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Gustavo Kuerten durante Brasil x Rússia pela Copa Davis
Gustavo Kuerten durante Brasil x Rússia pela Davis

Então, começou o calvário. Insatisfeito com a gestão de Nelson Nastás na Confederação Brasileira de Tênis (CBT), Gustavo Kuerten liderou um boicote à entidade. Ricardo Mello, Flavio Saretta e André Sá também aderiram, o capitão do time brasileiro, Jaime Oncins, pediu afastamento na sequência. Naquele ano, o Brasil foi derrotado por Paraguai, Venezuela e Peru, caindo para a terceira divisão da Davis, o Zonal Americano 2.

Em 2005, os brasileiros teriam de começar uma recuperação pelo degrau mais baixo de todos os tempos. Com Saretta, Mello e Sá de volta, a equipe fez 5 a 0 na Colômbia, em Bogotá. Depois, alcançou novo 5 a 0, contra as Antilhas Holandesas, em Florianópolis. E, por fim, já com Guga de volta à equipe, passou pelo Uruguai com um 3 a 2 em Montevidéu.

De volta à primeira divisão das Américas em 2006, o time brasileiro venceu Peru (3 a 2) e Equador (4 a 0), conquistando a chance de jogar a repescagem – e uma oportunidade de voltar à elite. O adversário seria a Suécia, mesma rival que havia iniciado a derrocada brasileira. Mas o então novato Robin Soderling não deu a menor chance aos brasileiros. E a torcida mineira assistiu a mais uma derrota para os suecos: 3 a 1.

O ano de 2007 começou com o Brasil precisando de apenas uma vitória no Zonal Sul-Americano para voltar à repescagem do Grupo Mundial. Diante do Canadá, a equipe contou com a boa fase de Flavio Saretta para fazer 3 a 1, deixando os brasileiros mais uma vez a somente uma vitória da elite. Mas, no duelo contra a Áustria, a grande fase de Jurgen Melzer e a quadra de carpete fizeram a diferença em favor dos rivais, que venceram a série por 4 a 1.

Em 2008, a história foi parecida: vitória tranquila no Zonal Sul-Americano, agora sobre a Colômbia, por 4 a 1. E depois uma parada duríssima nos playoffs, mais uma vez na casa do adversário e em quadra rápida. Contra a Croácia, do então inspirado Mario Ancic e do gigante Ivo Karlovic, os brasileiros Thomaz Bellucci e Thiago Alves bem que tentaram, mas não tiveram chances; a derrota por 4 a 1 mandou o Brasil, mais uma vez, para o grupo continental.

A história de 2009 começou idêntica à do ano anterior, com vitória por 4 a 1 sobre os colombianos. Mas, na luta para voltar ao Grupo Mundial, o cenário era outro. O Equador, do semi-aposentado Nicolas Lapentti, não era um rival difícil. E, jogando no saibro do Gigantinho, em Porto Alegre, o Brasil era considerado favorito na disputa.
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Marcelo Melo e Bruno Soares comemoram vitória na Copa Davis, no duelo entre Brasil e Rússia
Marcelo Melo e Bruno Soares comemoram vitória na Davis

Mas o velho Lapentti deixou para os brasileiros sua última grande exibição. Aos 33 anos, ele venceu Thomaz Bellucci e Marcos Daniel nas disputas de simples e, jogando ao lado do irmão Giovanni, conseguiu uma improvável vitória nas duplas, contra Marcelo Melo e André Sá – os dois eram uma das melhores parcerias do mundo à época. Foi a maior chance perdida pelos brasileiros até então para retornar à elite.

Mas, se 2009 ficou marcado como o ano de uma grande chance desperdiçada, não se pode dizer que 2010 foi muito diferente. O Zonal Sul-Americano, como a tradição recente mandava, foi uma mera formalidade, com 5 a 0 sobre o Uruguai. E o sorteio da repescagem do Grupo Mundial, que poderia ter colocado uma potência no caminho do Brasill, não foi ruim, reservando a Índia aos brasileiros.

A quadra era de grama, especialidade dos indianos, e fazia um calor infernal em Chennai. Mas, ainda assim, o desempenho dos brasileiros foi alvo de muitas críticas. Na sexta-feira, Thomaz Bellucci e Ricardo Mello venceram suas partidas, ambos em impressionantes batalhas de cinco sets. Nas duplas, valeu a experiência dos indianos Mahesh Bhupathi e Leander Paes. Mas foi no domingo que a reviravolta aconteceu – Thomaz Bellucci abandonou a partida contra Somdev Devvarman, e Ricardo Mello perdeu para Rohan Bopanna, um especialista em duplas que raramente joga torneios de simples.

Com 2011, novamente o Uruguai foi o rival americano, e mais uma vez o Brasil fez 5 a 0. No sorteio, contudo, a sorte não foi a mesma dos anos anteriores. Para voltar à elite, os brasileiros teriam de enfrentar a Rússia, bicampeã da Davis. Pior: em quadra rápida e na cidade de Kazan, casa do adversário. Só que os brasileiros surpreenderam e, com grandes exibições, chegou ao domingo em vantagem de 2 a 1. 

A primeira decisão para o Brasil seria o duelo entre Thomaz Bellucci e Mikhail Youzhny. O brasileiro teve duas chances de fechar o jogo, mas perdeu por 14 a 12 no quinto set. Na sequência, foi a vez de Ricardo Mello ser derrotado – 3 sets a 1 para Dimitry Tursunov. O jejum chegava a 8 anos e parecia jamais ter fim.

Mas 2012 chegou e, depois de passar novamente com facilidade pelo grupo Sul-Americano, com 4 a 1 sobre a Colômbia, o Brasil teria de encarar a Rússia mais uma vez. Só que, desta feita, o duelo seria no saibro e sob o calor intenso em São José do Rio Preto. Em casa, após quase uma década longe da elite, os brasileiros não tinham mais o direito de errar. 

De fato, não erraram. Na sexta-feira, Igor Andreev desistiu da partida contra Rogério Dutra Silva, quando perdia por 2 sets a 0, e Thomaz Bellucci fez 3 sets a 1 em Teymuraz Gabashvilli. 

Neste sábado, foi a vez de Marcelo Melo e Bruno Soares terminarem a história em três sets, com 7-5, 6-2 e 7-6 (9-7), encerrando a agonia que atravessou uma geração inteira do tênis brasileiro.

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