A primeira diz respeito ao julgamento. Houve um ajuste importante no critério de avaliação das manobras aéreas. Se imaginarmos um pêndulo que, de acordo com a posição, determina um peso maior ou menor para cada critério, diria que na última etapa ele voltou a se aproximar do surfe de carving, distanciando-se sutilmente das manobras aéreas.
Jadson André foi vítima disso. Perdeu injustamente para Julian Wilson, que na bateria praticou um surf cirúrgico, de linhas tão bem costuradas quanto insossas.
A questão é que Trestles pode parecer uma pista de decolagem, mas é mais que tudo uma parede afeita ao surfe de linha, continuado. No histórico de surfistas que se destacam lá, há uma lista de adeptos do carving como recurso principal. Claro, não faltam rampas interessantes, e muitas notas são conquistadas com manobras aéreas, mas não são centrais.
Chamou a atenção, por exemplo, a escala de notas para manobras executadas em ondas semelhantes, dadas ano passado e este ano. Em 2012, juízes achataram a pontuação de alguns movimentos, como se dissessem: “ei, trate de forçar menos para executar esta manobra e adaptá-la ao surf que a gente quer ver”.
E qual é o surf que a ASP quer ver? Aí vai outra lição: em Trestles, os juízes deixaram clara a opção de valorizar especialmente as performances de Joel Parkinson, o que parece ser um esforço para a manutenção das curvas mais tradicionais e clássicas do esporte na elite.
Joel foi beneficiado nas quartas de final contra Jordy Smith e teve ondas sobreavaliadas em quase todas as baterias disputadas. A favor dele, pesa o fato de que, fora o confronto contra o sul-africano e a derrota na final, para Kelly Slater, ele venceu, dentro d’água, todas as baterias que disputou. Vem surfando o fino, embora seu estilo lhe dê algum bônus de pontos.
Na etapa dos EUA, depois de um período sem grandes polêmicas, os juízes voltaram ao centro das discussões nos parcos botecos do mundo onde o assunto é prancha, e não bola. Essa eterna sístole e diástole na avaliação de manobras progressivas gera embates acalorados.
Na mala de mão, vai mais uma importante lição. Kelly Slater não foi o melhor surfista do evento. Em sua 50ª vitória no tour, ele venceu mais uma vez pelas bordas, como costuma fazer quando é campeão da temporada.
Os surfistas que pensam em disputar o título com o campeão das 11 taças devem se coçar para evitar que ele subverta a lógica do “melhor sempre vence”. Até porque, em muitos casos, como em Fiji, ele costuma ser realmente o melhor, de longe.
A última lição poderia estar no livro de bolso, a ser lido durante a viagem para La Graviere. Ali, estaria escrito que nada do que foi dito no texto é realmente uma lição. São apenas percepções de um observador. Na França, tudo pode – e deve – mudar.
As avaliações e critérios de julgamento são tão flexíveis quanto a ideia de que “uma onda nunca é igual e outra”. Costuma ganhar aquele que está com os sentidos aguçados a ponto de perceber os movimentos mais valorizados em cada onda. Costuma ganhar quem pode surpreender, mesmo sem ser o melhor.
A tal impermanência, tanto das condições do mar quanto do julgamento, que tanto assusta os leigos, é contraditoriamente o que pode tornar a competição de surf atraente e imprevisível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário